quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Nacionalidade: Reflexo Internacional e Constitucional sobre a Discussão Doutrinária entre o IUS SOLI e IUS SANGUINIS.

Carlos Lívio do N. Zuzarte*


Esse artigo foi elaborado com escopo de demonstrar na prática as veementes formas de utilização das teorias: IUS SOLI (origem territorial) e o IUS SANGUINIS (origem sanguínea), como cita Alexandre de Morais e Hildebrando Accioly, em acordo com o contexto histórico Internacional e Constitucional brasileiro, desmistificando as controvérsias destas supracitadas, fomentando proposta de debate sobre o que diz respeito sobre o tema. De acordo com estudos feitos sobre as matérias de direito internacional e constitucional brasileiro, foi observado que o tratamento dado a um dos assuntos que englobam às citadas matérias de direito, referente à nacionalidade e a utilização das teorias dos ius soli e ius sanguinis, encontra-se problemático e controvertido, causado polêmica entre os acadêmicos do curso de direito. O assunto originou-se da observação desde os acontecimentos remotos aos recentes no nosso país e no contexto internacional, especificamente, na forma de utilização das teorias face ao tratamento dado à identificação dos cidadãos dentro e fora do país. Partindo daí a simples indagação sobre o assunto, qual a teoria utilizada para identificar um cidadão a exemplificar, brasileiro, em outro território soberano; é a ius soli ou ius sanguinis?


A partir desta observação, dois grandes doutrinadores do direito brasileiro como o Alexandre de Morais em seu livro Curso de Direito Constitucional 26ª edição, São Paulo, Atlas - 2010 e Hildebrando Accioly em seu compêndio Manual de Direito Internacional Público 17ª edição, Saraiva – 2009, unificam seus entendimentos, de acordo com questionamento feito, fazendo prevalecer na prática, a real utilização do ius soli ou ius sanguinis nos contextos das matérias indicadas fortalecendo a tese aqui coroboroda. No texto capitulado por Hildebrando Accioly como: O Ser Humano no Direito Internacional, em seu tópico que toca o direito de nacionalidade, este afirma que “No exercício do direito de legislação, cabe ao Estado determinar quais os seus nacionais, as condições de sua aquisição e perda. Em outras palavras, trata-se de direito que o Estado exerce soberanamente, em geral de conformidade com a sua Constituição. Mas a tendência, ainda por se concretizar, é de que se trata de direito humano, conforme a Declaração Universal proclama em seu artigo XV: Todo Homem tem Direito a uma Nacionalidade”. (Accioly 17ª edição, Saraiva – 2009, p. 487). É óbvio que diante de todo processo histórico do direito internacional, em questões como a divisão geopolítica após a primeira guerra mundial, os países deveriam se organizar de forma a facilitar a localidade dos homens e mulheres nascidos em solo pátrio devendo retorná-los para obter sua proteção como afirma a declaração universal, onde a nacionalidade é um direito humano. O próprio Accioly (p. 488) explica que a nacionalidade pode ser originária ou adquirida, sendo a primeira a que resulta do nascimento e a segunda que provém da mudança da nacionalidade anterior. Em geral, todo indivíduo, ao nascer, adquire uma nacionalidade, que poderá ser de seus pais (jus sanguinis) ou do Estado de nascimento (jus soli). No passado, a nacionalidade era sempre a dos pais (jus sanguinis), mas, com o surgimento dos Estados Unidos e dos países da América Latina, os dirigentes dos novos países compreenderam que novo critério deveria ser adotado, dão surgindo o jus soli. A Constituição do Império consagrava essa tese ao estipular no art. 6º que: “São cidadãos brasileiros os que no Brasil tiverem nascidos, que sejam ingênuos ou libertos, ainda que o pai seja estrangeiro, uma vez que este não resida por serviço de sua nação”. Estabelecia-se, assim, o princípio do jus soli. Dizia a Constituição também que seriam os brasileiros “os filhos de pai brasileiro, e os ilegítimos de mãe brasileira, nascidos em pais estrangeiro que vierem estabelecer domicílio no Império”. Fez-se, dessa forma, concessão parcial ao jus sanguinis, dando-lhe força desde que acoplado ao jus domicilli. A Constituição do Império estendia a nacionalidade brasileira aos filhos de diplomatas nascidos no exterior. Na época o reconhecimento aos filhos de diplomatas da nacionalidade de seus pais era em decorrência do princípio da extraterritorialidade, ficção segundo a qual o diplomata continuava a residir em seu país, pois a missão diplomática era considerada parte do território nacional e os funcionários eram tidos como continuando a residir em seu respectivo país. O princípio do jus soli passou a figurar em todas as Constituições brasileiras, sendo que a exceção atribuída apenas aos funcionários que se encontrassem no exterior a serviço do País. A Constituição de 1988 vai mais longe, pois diz, segundo Accioly (p.488/489), no art. 12, I, c, que são brasileiros natos: “os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que venham a residir na República Federativa do Brasil, e optem a qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira”. Em decorrência do principio positivo do jus soli e do jus sanguinis, a criança pode nascer em dupla nacionalidade. Ao contrário no conflito negativo, a criança não adquire a nacionalidade quer jus soli quer jus sanguinis, ocorre à ausência de nacionalidade, ou seja, a criança será apátrida. Nesse ponto, cabe ressaltar que a Convenção Americana de Direitos Humanos reconhece, tal qual a Declaração Universal de Direitos do Homem o direito à nacionalidade (artigo 20). Além disso, de modo original, a Convenção combate a apatridia, ao determinar que o indivíduo tem direito à nacionalidade do Estado, em cujo território houver nascido, se não tiver direito a outra. Assim, neste último caso, o Estado seria obrigado a conceder a nacionalidade brasileira. É elementar que a Constituição do Império inseriu o ius soli para desvincular as atribuições de quem é nascido em território nacional, bem como daqueles que vem a adquirir à nacionalidade brasileira.


De maneira mais consubstanciada, nosso direito interno, é mais preciso na separação das teorias. Assim sendo, sobre o entendimento de Alexandre de Moraes em prima facie no tocante à nacionalidade, ele explicita que, “Nacionalidade é o vinculo jurídico político que liga um indivíduo a um certo e determinado Estado, fazendo deste indivíduo um componente do povo, da dimensão pessoal deste Estado, capacitando-o a exigir sua proteção e sujeitando-o ao cumprimento de deveres impostos”. (MORAES, 26ª Edição, Atlas – 2010, p.208) Dessa forma, Moraes (2010, p.209) explicita que a competência para legislar sobre nacionalidade é exclusiva do próprio Estado, sendo incontroversa a total impossibilidade de ingerência de normativa de direito estrangeiro. Este que tem igual entendimento do doutrinador já citado a respeito da competência legislativa sobre nacionalidade. Doutrinariamente, distinguem-se duas espécies de nacionalidade, primária e a secundária. A nacionalidade primária, também conhecida por originária, resulta do nascimento a partir do qual, através de critérios sanguíneos, territoriais ou mistos será estabelecida. A nacionalidade secundária ou adquirida é a que se adquire por vontade própria, após o nascimento e, em regra, pela naturalização. A Constituição Federal manteve o modelo de enunciar separadamente quais os casos de aquisição de nacionalidade originária e quais as hipóteses de aquisição secundária como fora feito pela Constituição anterior, em rompimento com a tradição constitucional brasileira, que enumerava todas as formas de aquisição da nacionalidade, em uma só seqüência. Moraes (p.209/210) atribui à diferenciação das teorias em estudo nos critérios de atribuição da nacionalidade originária, aplicando-os a partir do fato natural, o nascimento. Assim, ius sanguinis (origem sanguínea) – por esse critério será nacional todo o descendente de nacionais, independente do local de nascimento. Importante observar que a Constituição Federal de 1988 não adotou esse critério puro, exigindo-se sempre algum requisito, como veremos a seguir. Sempre, porém, deve estar presente uma relação de contemporaneidade dentre a condição jurídica do ascendente e o momento do nascimento, ou seja, aquele deverá ser brasileiro nato ou naturalizado a época do nascimento deste. Por outro lado, ius soli (origem territorial) – por esse critério será nacional o nascido no território do Estado, independentemente da nacionalidade de sua ascendência. A Constituição brasileira adotou-o em regra. Em resumo, o que diz respeito às duas teorias é a separação do seu uso interno com seu uso externo, visto que, desde a sua aparição no contexto jurídico, a nacionalidade é atribuída ao ius sanguinis, que por tempos, e pela evolução histórica foi relativizado de maneira parcial a sua utilização, uma vez que a inserção do novo princípio (ius soli) surgiu para diferenciar tanto a utilização interna (ius soli) como a utilização relativizada externamente (ius sanguinis) face aos requisitos estabelecidos pelas constituições dos Estados soberanos. Cabendo ressaltar que externamente o ius sanguinis é o mais utilizados nas relações internacionais no tocante a identificação do indivíduo para co a sua nacionalidade originária. Moraes (p.210), trás informações sobre as hipóteses de aquisição originárias, onde ilustra as definições das teorias em estudo, comentando que “a Constituição Federal prevê exaustiva e taxativamente as hipóteses de aquisição da nacionalidade originária, ou seja, somente serão brasileiros natos aqueles que preenchem os requisitos constitucionais das hipóteses únicas do art.12, inciso I. (Prevalecendo as duas teorias). Como ressalta Francisco Rezek (citado por Moraes, p.210), analisando hipóteses semelhantes, “seria flagrante, na lei, o vício de inconstitucionalidade, quando ali detectássemos o intento de criar, à margem da Lei Maior, um novo caso de nacionalidade originária. A regra adotada, como já visto, foi jus soli, mitigada pela adoção do jus sanguinis somado a determinados requisitos. Assim são brasileiros natos:  Os nascidos na Republica Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país.(ius soli).  Os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil (ius sanguinis + critério funcional).  Os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente (ius sanguinis + registro – EC nº54/07).  Os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que venham a residir na Republica Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade (EC nº54/07), pela nacionalidade brasileira (ius sanguinis + critério residencial + opção confirmativa). Em virtudes dos fatos e fundamentos instruídos e demonstrados como está sendo utilizadas as teorias que causaram muitas discussões, é veemente a confirmação que mesmo com a adoção do ius soli, a grande utilização tanto no direito interno como nas relações internacionais é do ius sanguinis, devido ao maior atendimento doutrinário sob os requisitos de aquisição de nacionalidade. Dessa forma, a concordância dos doutrinadores utilizados no estudo, foi fundamental para desmistificar o que fica a cargo do ius soli e do ius sanguinis corroborando como corolário lógico para o prevalecimento do ius sanguinis na grande maioria das relações internas e externas no que toca a nacionalidade. *Graduado Bacharel em Direito pela Universidade Tiradentes. Aracaju/ SE. Bibliografia: MORAIS. Alexandre de, Curso de Direito Constitucional. 26ª edição, São Paulo, Atlas – 2010. ACCIOLY. Hildebrando, Manual de Direito Internacional Público.17ª edição, Saraiva – 2009.