quarta-feira, 15 de junho de 2011

A Influência dos Valores do Estado Liberal do Direito e do Positivismo Jurídico Sobre os Conceitos Clássicos da Jurisdição.

Carlos Lívio do N. Zuzarte*


Esse artigo opinativo foi elaborado com escopo de demonstrar de acordo com os valores clássicos, a luta pela independência e harmonia entre os poderes, fomentando seus limites de atuação e uma proposta de debate sobre as leis complexas e obtusas que continuam em vigor, trazendo a responsabilidades dos representantes do povo para a observação dessas leis e adequarem as mesmas à Constituição.

O Estado liberal de Direito, diante da necessidade de frear os desmandos do regime que lhe antecedeu (absolutismo), erigiu o princípio da legalidade como fundamento para sua imposição. Esse princípio elevou a lei a um grau de ato supremo. Assim a administração dos juízes, a partir deste, ficariam impedidos de inovar qualquer direito ou razão pública que chocasse com a lei.

De acordo com esse entendimento de limitação das funções jurisdicionais, essa concepção de direito no estado liberal, fez os parlamento da Europa continental, reservarem para si o poder político mediante a fórmula do princípio da legalidade. Diante da hegemonia do parlamento, o poder executivo e o judiciário, assumiram posições óbvias de subordinação; o executivo somente poderia atuar sendo autorizado por lei e nos seus exatos limites, e o judiciário apenas aplicá-la sem mesmo poder de interpretá-la; o legislativo, assim, assumia uma nítida posição de superioridade.

Na separação dos poderes, a criação do direito era tarefa única e exclusiva do poder legislativo.


Sendo desta maneira encarada pela sociedade civilizada, a visualização de uma sociedade oprimida pela superioridade de um poder, Montesquieu, autor da obra que idealizou a teoria da separação dos poderes, recepcionada pelo Estado Liberal diz que “o poder de julgar” deveria ser exercido através de uma atividade puramente intelectual, não produtiva de “direitos novos”. Essa atividade não seria limitada apenas pela legislação, mas também pela atividade executiva, que teria também o poder de executar materialmente as decisões que constituem o “poder de julgar”. Nesse sentido, o poder dos juízes ficaria limitado a corroborar que já havia sido dito pelo legislativo, pois o julgamento deveria ser “um texto exato da lei”. Por isso Montesquieu acabou concluindo que o poder de julgar “era, de qualquer modo, um poder nulo” (en quelquer façon, nulle).
A idealização do Estado de direito liberal feita pela burguesia adotou um conceito de lei que repousa em uma velha tradição européia – herança da filosofia grega, que passou à Idade Média através da escolástica –, conforme o qual a lei não é uma vontade de um ou de muitos homens, mas uma coisa geral-racional (não é voluntas, mas ratio), no processo de afirmação da burguesia, tal noção de lei cedeu espaço para o seu oposto, isto é, para noção de lei definida pelos representantes do absolutismo do Estado, segundo qual, na fórmula clássica cunhada por Hobbes, auctoritas, non veritas facit legem – a lei é vontade, não vale por qualidades morais e lógicas, mas precisamente como ordem.

O princípio da legalidade, assim, acabou por constituir um critério de identificação do direito; o direito estaria apenas na norma jurídica, cuja validade não dependeria de sua correspondência com a justiça, mas somente de ter sido produzida por uma autoridade dotada de competência normativa. Nessa linha de raciocínio, autores qualificam o princípio da legalidade como meta-norma de reconhecimento de normas vigentes, acrescentando que, segundo esse princípio, uma norma jurídica existe e é válida apenas em razão das formas de sua produção. Ou melhor, nessa dimensão a juridicidade da norma está desligada de sua justiça intrínseca, importando somente se foi editada por uma autoridade competente e segundo um procedimento regular.


Dessa forma retorna-se a corroborar o motivo pelo qual o poder legislativo se titularizou órgão de superioridade em face dos demais.
Antes do Estado legislativo, do advento do princípio da legalidade (ao se vê, extremado), o direito não decorria da lei, mas sim da jurisprudência e das teses dos doutores, e por esse motivo existia uma grande pluralidade de fontes, procedentes de instituições, não só diversas, mas também concorrentes, como o império; a igreja; etc.

A criação do Estado Legislativo, portanto, implicou na transformação das concepções de direito e de jurisdição.

Porém, a neutralidade ou a falta de conteúdo da lei e da jurisdição, ou, enfim, do próprio Estado Legislativo – rapidamente fez perceber que a igualdade social constituía requisito para efetivação da própria liberdade, ou melhor, para o desenvolvimento da sociedade. Conclui-se, em síntese, que a liberdade somente poderia ser usufruída por aquele que tivesse o mínimo de condições materiais para ter uma vida digna.

Surge então, o Estado preocupado com as questões sociais que impediam a “justa” inserção de cidadão na comunidade. Com ele explodem grupos orientados à proteção de setores determinados que nessa linha passam a fazer pressão sobre o legislativo, visando leis federais.
Tais grupos de pressão – sindicatos, associações de profissionais liberais, associações de empresários, etc. – não apenas dão origem as leis destinadas a regular as suas próprias áreas de interesse, mas também passam a medir força entorno das leis que são de interesse comum de sindicatos de trabalhadores e empresários, por exemplo.

Cabe lembrar, que à época do Estado Liberal, a lei era considerada fruto da vontade de um parlamento habitado apenas por representantes da burguesia, no qual não havia confronto ideológico. Após essa fase, as casas legislativas deixam de ter um lugar de uniformidade, tornando-se local de divergências, em que diferentes ideais acerca do papel do direito e do Estado passam a se confrontarem. Aí, evidentemente não há vontade geral podendo-se falar em uma “vontade política”, ou melhor, na vontade do grupo mais forte dentro do parlamento. Atualmente, porém, essa vontade política pode se confundir com a vontade dos LORDES defensores dos direitos indisponíveis, como os fundamentais e garantias individuais, coletivas e difusas e, em contra sensu, a dos grupos de pressão que atuam dentro do parlamento.
A falta de conhecimento do direito, e até mesmo da tentativa de desprezo dos direitos básicos e indisponíveis, por parte dos grupos de pressão, gera a cada dia leis mais complexas e obtusas, fruto de ajustes e compromissos entre poderes sociais em disputa.

A priori surgi o neoconstitucionalismo que exige a compreensão crítica da lei em face da Constituição, para o final fazer surgir uma projeção ou cristalização de normas adequadas que também pode ser entendida como “conformação da lei”.


Portanto, conclui-se que, com essa transformação da ciência jurídica ao dar ao jurista uma tarefa de construção – e não mais simples revelação – confere-lhe maior dignidade e responsabilidade, já que dele se espera uma atividade essencial para dar efetividade aos planos instruídos nas Constituições, ou seja, a exemplo da nossa CF/88, dar ordens de comando geral, para que nos limites da lei sejam executadas administrativa e judicialmente e, quando houver controvérsias sobre determinado assunto de direito, deveres ou obrigações, públicos ou privados, sejam julgados e dados a satisfação da pretensão buscada. Assim sendo, de acordo com a evolução da sociedade, faz-se garantir a evolução do direito sem abalar suas estruturas criadoras de princípios, regras, preceitos éticos e morais, marcas dos costumes culturais do meio evolutivo dessa sociedade indubitavelmente civilizada e organizada.

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*Graduado Bacharel em Direito pela Universidade Tiradentes. Aracaju/ SE.

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